Legado do G20 e desafios para a COP 30

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O G20, grupo que reúne as maiores economias do mundo, desempenha um papel estratégico na definição de diretrizes globais em questões econômicas, sociais e ambientais. Em suas últimas reuniões, o grupo tem enfrentado desafios ligados à transição energética e à mitigação das mudanças climáticas, enquanto busca equilibrar interesses nacionais e coletivos. O recente encontro do grupo realizado no Brasil em novembro destacou a necessidade urgente de iniciativas concretas que viabilizem a transição para uma economia de baixo carbono, ao mesmo tempo em que abordam desigualdades históricas.

Um dos avanços notáveis foi a aprovação dos “Princípios para Transições Energéticas Justas e Inclusivas”, que priorizam o combate à pobreza energética, a ampliação do acesso à energia limpa e a geração de emprego e renda para comunidades vulneráveis. Os princípios reforçam o fortalecimento de capacidades locais, a implementação de políticas inclusivas e de mecanismos de financiamento acessíveis, fundamentais para viabilizar projetos que promovem a democratização das energias renováveis, inclusão social e empoderamento comunitário.

A Declaração Final da Cúpula do G20, aprovada por consenso, endossou metas ambiciosas, como triplicar a capacidade de energias renováveis e dobrar a eficiência energética global até 2030, e reconheceu a necessidade de investimentos em transições energéticas nos países em desenvolvimento. Além disso, o documento também menciona o fortalecimento de capacidades, estratégias de políticas, cooperação entre diferentes níveis de governo e criação de ambientes facilitadores para atrair financiamentos, como o apoio a mecanismos de financiamento de baixo custo e planejamento energético inclusivo. Outro destaque é a menção do compromisso de eliminar gradualmente subsídios ineficientes a combustíveis fósseis, direcionando recursos para iniciativas sustentáveis, e reforçando a urgência de transições justas e inclusivas, especialmente para os mais pobres e vulneráveis.

Apesar de avanços importantes — como a criação da Coalizão Global pelo Planejamento Energético (GCEP), liderada pela International Renewable Energy Agency (IRENA), e o desenvolvimento de Roadmaps de Financiamento da Transição Energética, conduzido por instituições como o Banco Mundial, Sustainable Energy for All (SEforALL) e a International Energy Agency (IEA) —, a influência persistente do lobby dos combustíveis fósseis, em especial a promoção do gás natural como combustível “de transição”, continua sendo um obstáculo significativo. Essa narrativa, fortemente defendida em fóruns internacionais, desvia recursos e atenção de soluções verdadeiramente sustentáveis, comprometendo o avanço de uma transição energética alinhada às metas climáticas globais.

Rumo à COP 30

A realização deste evento em Belém, no Brasil, representa uma oportunidade única para o país assumir um papel de protagonismo na agenda climática internacional, especialmente considerando que ocorrerá logo após a presidência brasileira do G20 e no mesmo ano em que o Brasil sediará o encontro do BRICS.

Este é um momento estratégico para o Brasil demonstrar sua capacidade de liderar e articular soluções climáticas ambiciosas. O país reúne credenciais significativas, como sua posição de destaque entre as maiores economias emergentes, sua imensa biodiversidade e seu vasto potencial para o desenvolvimento de energias renováveis. Além disso, conta com uma diplomacia internacional amplamente reconhecida por sua competência e influência, fortalecida pela atuação de lideranças como Marina Silva, Ana Toni e André Corrêa do Lago. Esses nomes têm se destacado como representantes qualificados, experientes e profundamente comprometidos com a agenda climática global, reforçando o papel do Brasil como um ator-chave nas negociações multilaterais.

O fato de a COP 30 coincidir com os 10 anos da assinatura do Acordo de Paris, firmado na COP 21, confere um peso simbólico e político adicional ao evento. Esse marco na luta contra as mudanças climáticas reforça a responsabilidade do Brasil de liderar esforços globais, promovendo ações concretas de mitigação e adaptação. Mais do que uma celebração histórica, a década do Acordo de Paris representa um momento crucial para revisar os compromissos climáticos firmados pelas nações. É uma oportunidade de promover um balanço rigoroso dos avanços alcançados desde 2015 e de estabelecer metas ainda mais ambiciosas. Entre os pontos centrais desse debate estão a atualização das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e a definição do Novo Objetivo de Financiamento Climático (NCQG).

Entretanto, os desafios são muitos. O cenário político global segue incerto, com potenciais retrocessos com a reeleição de Donald Trump nos Estados Unidos, representando um risco à cooperação climática global, dado seu histórico de desmantelamento de acordos ambientais, como o Acordo de Paris. Além disso, a postura protecionista de potências econômicas e o uso estratégico de tecnologias energéticas e minerais críticos têm potencial para intensificar disputas, dificultando consensos em fóruns multilaterais, como o G20 e as COPs. Esse cenário reforça a necessidade de maior protagonismo das nações em desenvolvimento, que devem pressionar por compromissos ambiciosos e alinhados a uma transição energética justa.

No âmbito doméstico, a disparidade de investimentos entre combustíveis fósseis e fontes renováveis, evidenciada no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), expõe contradições na política energética brasileira.

Outro ponto crucial é o financiamento climático. Países em desenvolvimento, como o Brasil, precisam de definições claras sobre fontes e montantes financeiros, bem como mecanismos que assegurem a destinação desses recursos às regiões mais vulneráveis.

A sociedade civil tem um papel estratégico a desempenhar nesse contexto. A COP 30 deve ser um espaço inclusivo, com ampla participação social, para garantir que as vozes das populações mais impactadas sejam ouvidas. Isso demanda esforços coordenados para fortalecer a capacidade de influência sobre as decisões tomadas.

A transição energética é mais que uma resposta à crise climática, é um imperativo social e econômico. Para o Brasil, sediar a COP 30 é uma oportunidade para liderar pelo exemplo. Que o país aproveite este momento para se consolidar como uma potência energética renovável global, demonstrando que é possível aliar crescimento econômico com justiça social.

Autora: Graziella Albuquerque é consultora em Políticas Públicas Nacionais e Internacionais sobre Clima e Energia.

Os pontos de vista e opiniões expressos neste artigo são dos próprios autores, e não refletem necessariamente os defendidos pela pv magazine.

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