A Arquitetura Solar como Chave para a Produção de Hidrogênio Verde

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A integração de módulos fotovoltaicos (FV) em edificações é uma estratégia eficiente para geração de energia solar, viabilizada por duas abordagens principais: BAPV (Building-Applied Photovoltaics) e BIPV (Building-Integrated Photovoltaics). Na abordagem BAPV, os módulos são aplicados em edificações existentes, sem necessariamente considerar integração arquitetônica, sendo posicionados com orientações e inclinações que podem ou não coincidir com o projeto original. Já o BIPV, também chamado de arquitetura solar, incorpora os módulos ao design da edificação, substituindo materiais convencionais da construção civil e desempenhando funções como sombreamento (brises), revestimento, vedação, proteção e estética.

A abordagem BIPV vai além da geração energética: proporciona redução de custos ao substituir materiais tradicionais da construção civil, e ainda pode proporcionar conforto térmico, lumínico e acústico, além de atender a critérios de segurança, durabilidade e viabilidade de manutenção. Essa tecnologia permite integrar funcionalidades construtivas e estéticas à arquitetura, criando conceitos e valores visuais.

No entanto, no Brasil, a maior parte das instalações ainda segue o modelo BAPV. A baixa demanda por produtos específicos para BIPV, como módulos fotovoltaicos flexíveis, semitransparentes e com diferentes texturas, além de perfis de fixação otimizados, reflete um mercado ainda em desenvolvimento. Para que a arquitetura solar ganhe espaço, é necessário primeiramente um esforço de conscientização no setor, destacando a multifuncionalidade dos módulos fotovoltaicos em edificações e enfrentando desafios como sombreamento e orientações menos ideais.

Laboratório Fotovoltaica/UFSC: Pioneirismo na Pesquisa em Arquitetura Solar no Brasil.

Desde 1997, o Laboratório Fotovoltaica/UFSC vem liderando o desenvolvimento de aplicações fotovoltaicas em edificações no Brasil. O primeiro sistema BIPV conectado à rede elétrica pública foi implementado pelo Laboratório, com potência de 2 kWp, e segue em operação após 27 anos, comprovando a robustez da tecnologia. A sede do Laboratório, localizada fora do campus principal da UFSC, é um exemplo de inovação. Com dois prédios inaugurados em 2015 e um terceiro em 2023, todos os edifícios utilizam tecnologia FV integrada na forma de BIPV.

Sede do Laboratório Fotovoltaica/UFSC, em Florianópolis/SC.

O mais novo prédio do Laboratório, inaugurado em 2023, é fruto de projetos de P&D financiados por instituições como GIZ, BYD Energy, ENGIE Brasil Energia e SHELL Brasil. Idealizado como um equipamento, o prédio abriga um laboratório de hidrogênio verde (H2V) e demonstra a aplicação da tecnologia FV em sua plenitude. O conceito arquitetônico expõe instalações e sistemas fotovoltaicos, evidenciando seu funcionamento e integrando tecnologia solar a todos os ambientes.

Novo prédio do Laboratório Fotovoltaica/UFSC em Florianópolis-SC, gerador de energia solar e hidrogênio verde.

Além da produção de energia limpa, o prédio adota medidas sustentáveis, como captação e reuso de água da chuva, ventilação natural, iluminação natural, aberturas zenitais, uso de LEDs e materiais locais. Os sistemas fotovoltaicos (FV) não apenas geram energia limpa e sustentável, mas também desempenham um papel crucial no conforto ambiental das edificações e na produção de hidrogênio verde. A energia gerada pelas fachadas e coberturas fotovoltaicas e a água armazenada para reuso tornam o edifício autossuficiente na produção de hidrogênio verde.

Integrações fotovoltaicas do prédio do Laboratório Fotovoltaica/UFSC, em Florianópolis-SC.
Armazenamento de água de reuso no Laboratório Fotovoltaica/UFSC, em Florianópolis-SC.

Coberturas fotovoltaicas: Energia, Isolamento Térmico e Captação de Água da Chuva

As coberturas utilizam módulos single-glass de silício monocristalino (mono-Si) bifaciais com backsheet transparente e moldura. A principal diferença entre as duas coberturas está na presença ou ausência de grid entre as células fotovoltaicas: os módulos sem grid permitem uma maior transparência entre as células FV, contribuindo para a entrada de iluminação natural na edificação; os que têm grid otimizam o desempenho frontal do módulo.

Além da geração de energia, as coberturas fotovoltaicas também oferecem sombreamento estratégico às lajes de concreto, reduzindo significativamente a radiação solar incidente e a carga térmica correspondente. Essa proteção térmica contribui para o conforto interno e diminui a demanda por sistemas de ar-condicionado, promovendo eficiência energética e economia.

Além disso, as coberturas fotovoltaicas são projetadas para captar água da chuva, que é armazenada em cisternas e utilizada como insumo no processo de produção de hidrogênio verde, junto com a eletricidade solar. Essa captação é viabilizada pela estanqueidade das coberturas e pela instalação de um sistema eficiente de drenagem. Calhas intermediárias coletam a água da superfície dos módulos FV e a conduzem para calhas maiores, que transportam o recurso até as cisternas de armazenamento. Esse processo garante o reuso da água de forma sustentável, integrando soluções energéticas e hídricas no mesmo sistema. Essa mesma água é usada em descarga de vasos sanitários e produção de hidrogênio verde; nesta última aplicação passando ainda por processos de filtragem e osmose reversa para chegar à pureza necessária ao processo de eletrólise.

Fachadas fotovoltaicas: Energia, Proteção e Sustentabilidade

Os sistemas fotovoltaicos das fachadas são compostos por módulos double-glass de silício monocristalino (mono-Si) bifaciais com moldura. Além de gerarem energia, vedam parcialmente o auditório semiaberto, protegendo os usuários contra intempéries e criando um ambiente confortável em termos térmicos, lumínicos e visuais. A energia gerada pelas fachadas também contribui para a produção de hidrogênio verde, reforçando o compromisso do edifício com práticas sustentáveis.

Fachada fotovoltaica do prédio do Laboratório Fotovoltaica/UFSC, em Florianópolis-SC.

Brises fotovoltaicos: Energia, Sombreamento Estratégico e Eficiência Energética

Os brises (dispositivos de sombreamento) fotovoltaicos utilizam módulos double-glass de silício monocristalino (mono-Si) bifaciais sem moldura, instalados sobre glazings de vidro. Esses módulos, além de gerarem energia, proporcionam um sombreamento estratégico, reduzindo a radiação solar direta nos ambientes internos. Essa característica diminui a necessidade de ar-condicionado e iluminação artificial, promovendo economia de energia. Assim como nas coberturas e fachadas, a energia solar gerada pelos brises é utilizada no laboratório para a produção de hidrogênio verde.

Brise fotovoltaico do prédio do Laboratório Fotovoltaica/UFSC, em Florianópolis-SC.

Imagem: Fotovoltaica UFSC

Hidrogênio Verde: Transição Energética e Descarbonização

O hidrogênio verde produzido no prédio representa uma inovação no uso de recursos renováveis. A combinação da energia solar gerada pelos sistemas FV e da água da chuva captada pelas coberturas demonstra como soluções integradas podem maximizar o uso sustentável dos recursos naturais. Esse hidrogênio serve como combustível limpo, alinhando o edifício com os objetivos globais de transição energética e descarbonização.

Gerador de hidrogênio verde, localizado no Laboratório Fotovoltaica/UFSC, em Florianópolis-SC.

Os sistemas fotovoltaicos, quando integrados de forma inteligente, vão muito além da geração de energia. Eles são aliados no conforto ambiental das edificações, promovem sustentabilidade e viabilizam a produção de hidrogênio verde e seus derivados, uma tecnologia-chave para o futuro energético. Essa abordagem evidencia como a união entre arquitetura, tecnologia e inovação pode transformar edificações em modelos de eficiência e sustentabilidade.

O Laboratório Fotovoltaica/UFSC segue como referência no avanço da arquitetura solar no Brasil, promovendo o uso de BIPVs em projetos que combinam eficiência energética, estética e sustentabilidade, inspirando mudanças de paradigmas no setor de energia solar.

Autores

Isadora Pauli Custódio & Ricardo Rüther

Laboratório de Energia Solar Fotovoltaica da Universidade Federal de Santa Catarina – www.fotovoltaica.ufsc.br

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