A inclusão de sistemas de armazenamento em baterias no próximo leilão de reserva de capacidade pode atrair uma oferta de até 2 GWh de projetos de armazenamento, de acordo com fontes ouvidas pela pv magazine Brasil. Na última terça-feira (09/05), a Câmara dos Deputados realizou uma audiência pública sobre a inclusão de fontes renováveis e não despacháveis, como eólica e fotovoltaica, aliadas a sistemas de armazenamento em baterias (BESS) no Leilão de Reserva de Capacidade na forma de Potência de 2024 (LRCAP 2024), previsto para agosto. Representante do MME, EPE e ONS não confirmaram nem negaram a participação da tecnologia.
A Consulta Pública nº 160 aberta pelo Ministério e Minas de Energia (MME) com uma sugestão de minuta das diretrizes para a realização no leilão, previa apenas a participação de ampliações de usinas hidrelétricas e novas usinas térmicas.
Essa consulta recebeu mais de 100 contribuições da sociedade e quase 40 delas voltadas para demonstrar a viabilidade técnica e interesse dos fabricantes da inclusão das baterias neste cenário, por meio de entidades como Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia (ABSAE) e a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
De acordo com o diretor técnico da Huawei Digital Power Brasil, Roberto Valer, diversos clientes da empresa manifestaram o interesse de investir “milhões” em sistemas de armazenamento, assim como já fazem em outros países.
“Há muitos interessados, que enxergam o leilão de reserva de capacidade como uma oportunidade, mas ainda não temos uma regra clara de participação – mesmo com sugestões enviadas pelos interessados na consulta pública. As empresas que estão desenvolvendo esses projetos, estão fazendo no escuro, sem saber o tempo autonomia das baterias, se são projetos stand-alone ou integrados à geração, pincipalmente em usinas já existentes ou em construção. São parâmetros de extrema importância para viabilizar os projetos. O cenário pelo qual estamos lutando é que o MME permita a inclusão das baterias no leilão e, em seguida, a Aneel defina as regras de como devem ser as conexões e outorgas. Para que haja tempo hábil, acreditamos que o cenário ideal seria adiar a data do leilão para que os atores do mercado de baterias consigam se organizar”, comenta Valer. “Repito, o interesse é muito grande. Já temos mais de 1,5 GWh em cotação de empresas que querem concorrer no leilão”, ele adiciona. No Brasil, a Huawei já forneceu 72 MWh de capacidade de armazenamento em baterias, a maior parte em aplicações atrás do medidor.
Em abril, a vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios da Scatec, Debora Canongia, disse que a companhia norueguesa tem como ambição se tornar um dos principais players no segmento de armazenamento. “Estamos aguardando o leilão de reserva de capacidade que frustrou o mercado [ao não incluir o armazenamento entre as tecnologias em sua consulta pública]”, disse ela na ocasião. A Scatec tem experiência com a solução de solar com armazenamento em baterias e entregou na África do Sul um projeto combinando 540 MW de energia solar e 225 MW de bateria.
No caso de o MME incluir baterias no leilão de reserva de capacidade, o CEO da You.on, fabricante brasileira de soluções de armazenamento, André Vitti afirma que a empresa teria capacidade para atender essa demanda com baterias próprias. “Temos expectativa e capacidade de atender entre 1,5 e 2 GWh de investidores interessados nas baterias para eventualmente concorrer no leilão, entre players do setor, assim como fundos de investimento nacionais e internacionais”.
As baterias poderiam inclusive ser associadas as térmicas, uma alternativa levantada na audiência pública na Câmara que talvez não estivesse no radar de alguns dos stakeholders envolvidos no processo, destaca Vitti. “A bateria é o agente que faz com que as energias renováveis sejam incorporadas de forma consistente e o governo sabe disso e entende que as baterias serão um player importante, mas que ainda precisamos de regulamentação. Então, o desafio do governo será o de regular rapidamente de um lado e, ao mesmo tempo, atender às demandas energéticas no curto prazo”, explica.
A You.on foi a responsável pelo fornecimento e instalação de um banco de baterias de íons lítio de 67 MWh, inversores, transformadores, softwares de gestão de energia e sistemas de automação, proteção e controle e até hoje realiza o monitoramento do primeiro projeto de armazenamento de energia em larga escala do Brasil, em Registro, São Paulo, para a ISA CTEEP.
Uma solução para múltiplos desafios
Com 3 GWh em sistemas de armazenamento instados no mundo, a TBEA, fabricante chinesa de inversores e baterias de armazenamento, já recebeu 1 GWh de cotações de demandas em estudo por clientes interessados em participar no leilão de reserva de capacidade caso as baterias sejam incluídas. “Ainda não temos projetos no Brasil, portanto o leilão seria uma grande oportunidade de entramos nesse segmento, assim como para todos os grandes players que têm a capacidade de desenvolver projetos de grande capacidade no país”, disse o gerente de vendas da TBEA, Rogerio Costa.
Para Costa, o leilão é fundamental para desenvolver todo o mercado e a cadeia de armazenamento de energia no Brasil, assim como foi feito no passado com o mercado solar, que cresceu inicialmente por meio dos leilões. “Além disso, outra demanda que está se tornando cada dia mais latente é a necessidade do uso de baterias para controle de frequência e tensão. Portanto, a ideia é se antecipar e não deixar o problema acontecer para depois tentar resolver. A entrada das baterias já começaria a mitigar alguns problemas que a gente vê em pequena escala, mas que podem vir a se tornar grandes problemas”, adiciona o executivo.
“Toda nova tecnologia que chega ao mercado precisa estar respaldada por uma condição diferenciada que a torne mais competitiva. Essa diferenciação poderia ser realizada separando os lotes, como o de hidrelétricas, térmicas (greenfield ou bronwfield) e o de armazenamento (stand-alone ou conectados a fontes renováveis)”. Para o gerente da TBEA, o sistema stand-alone se tornaria competitivo com a compra de energia no mercado livre, por exemplo. Outra vantagem do stand-alone é a possibilidade de instalar as baterias justamente no ponto de carga e trazer as baterias aos grandes centros de consumo. Já o BESS junto às fontes renováveis seria ainda mais competitivo, porque eu já conta com uma energia incentivada no local de instalação, avalia Costa.
Audiência pública deixa uma sensação positiva
Para o vice-presidente de negócios, marketing e inovação da UCB Power, Marcelo Rodrigues, a audiência pública de terça-feira trouxe uma discussão ampla na Câmara dos Deputados, “muito rica e franca, na qual todos os atores entenderam o potencial do armazenamento. Saímos da sessão muito animados com o fato de que todos os pontos de atenção foram respondidos na consulta pública e temos a expectativa da inserção das baterias no leilão. Também temos a missão de organizar um workshop para aprofundamento dessa discussão técnica junto ao MME”.
“Apesar de termos um desafio muito grande pela frente, principalmente de cunho político, sentimos que a hora do armazenamento chegou e temos certeza de que ossos legisladores vão entender o benefício dessa tecnologia em um cenário de transição energética”, pontuou o executivo.
A WEG, que fabrica os BESS no Brasil, também avaliou a audiência pública como positiva para o armazenamento de energia. “O uso de baterias é um passo importante para a modernização do setor elétrico brasileiro. Em outros países o armazenamento já desempenha um papel importante na reserva de capacidade, trazendo flexibilidade e redução de custos na operação do sistema”, diz o diretor Superintendente de Digital & Sistemas da WEG, Carlos José Bastos Grillo.
O executivo diz que a WEG está atenta às discussões sobre o tema e vem apoiando a elaboração dos projetos com os principais participantes do setor, visando a inclusão do armazenamento de energia por baterias no próximo leilão de reserva de capacidade. “Estamos acostumados com sistemas de grande porte conectados à rede e já fabricamos todo o BESS no Brasil. Temos experiência também em mercados mais maduros, como os Estados Unidos, e entendemos que a inclusão nos leilões será um gatilho importante na geração de demanda para esse mercado”, avalia o executivo.
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